sábado, 2 de janeiro de 2010

Nova onda de contratações aponta alta de salários e risco de "rouba-rouba"

Aumento do volume de obras aquece contratações de profissionais qualificados e traz, de volta, os riscos de "rouba-rouba" de engenheiros e aumento de salários. Conheça os perfis mais demandados.

Mal se consolidou o reaquecimento dos negócios da construção civil e o mercado de contratações já volta à caça aos profissionais. O relato é de consultores de recursos humanos e de incorporadoras. A paulista Tecnisa Construtora e Incorporadora, por exemplo, está mapeando as áreas de crescimento na empresa e planeja aumentar em 30% sua força de trabalho até o término de 2010.

De acordo com a gerente de recursos humanos da incorporadora, Denise Bueno, os profissionais mais demandados para os novos postos serão aqueles relacionados às áreas de novos negócios, desenvolvimento de produtos e prospecção de terrenos. "São engenheiros, arquitetos e profissionais com mais experiência e bons olhos para viabilidade dos projetos", explica.

Embora mais conservadora que a Tecnisa, a Helbor Empreendimentos, que atua em 23 cidades brasileiras, também está contratando e, nos últimos meses, absorveu profissionais com experiências relevantes em empresas do setor imobiliário e financeiro para atender as necessidades específicas em diversos departamentos. O vice-presidente-executivo da empresa, Henry Borenstein, explica que o processo de contratação adotado na companhia incluiu o reforço de equipes ligadas às áreas de desenvolvimento de produto, de engenharia e da gestão financeira, para cuidar do volume de clientes.

A headhunter (especialista na procura de profissionais) da área de engenharia da consultoria de recrutamento e seleção Michael Page, Léa Fedelman, fornece dados que demonstram a agitação da área de recursos humanos no setor de construção civil. A empresa oferece atualmente cinco vezes mais postos de trabalho do que oferecia no período de crise. Segundo Léa, a empresa dispõe de cerca de 150 vagas para engenheiros em diversos níveis e, durante crise, oferecia apenas 30. "E muitas vagas eram decorrentes de substituições de dois ou três funcionários por um mais experiente", lembra a consultora.

Segundo ela, a movimentação no setor de RH é decorrente do cenário promissor da construção civil para os próximos anos. Léa distingue as áreas de grandes obras, incentivadas pela realização das Olimpíadas e da Copa, e do mercado imobiliário, motivada pelo projeto MCMV (Minha Casa, Minha Vida).

Nos segmentos habitacional e comercial, o cenário é mais favorável para os gestores de obras e profissionais com habilidade em planejamento e orçamento. Ela identifica um engenheiro civil com pós-graduação em gerenciamento de projetos, como profissional ideal e explica: "o segmento de baixa renda - que tende a crescer por conta do plano MCMV - exige conhecimento em infraestrutura porque os projetos têm muitas torres e demandam a instalação de todos os serviços de arruamento e de desenvolvimento urbano". Por outro lado, a área de grandes obras, gerida por escritórios de projetos técnicos de engenharia, demanda profissionais habilitados a assumirem gerências de contratos, que podem chegar à ordem dos R$ 500 milhões.

Segundo o consultor para recrutamento de média e alta gerência da Adecco Brasil, Frederico Moraes, há uma grande procura por profissionais de novos negócios, compras de terrenos, estudos de viabilidade e da área de contabilidade. Moraes também adverte para uma possível concorrência entre segmentos diversos na área de construção, já que além das construções das habitações do Minha Casa, Minha Vida - que já começam a sair do papel - há ainda a demanda do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), cujos projetos estão sendo acelerados por conta da proximidade do ano eleitoral, e das obras de infraestrutura e de equipamentos esportivos para os Jogos Olímpicos e Copa do Mundo.

Nesse sentido, Fernando Marucci, diretor da Asap, empresa de recrutamento, acrescenta as contratações de pequenas centrais hidrelétricas, que apesar de terem paralisados seus investimentos durante a crise, "deverão retomar os projetos de obra agora, na medida em que a economia se recupere", diz. Por conta dessa tendência de aumento da procura por profissionais qualificados, o diretor alerta: "É prudente que as construtoras invistam prontamente em mecanismos de retenção de talentos e na contratação de trainees para formarem sua base de funcionários".

Na Helbor, o risco de perder bons profissionais vem sendo minimizado com ações de retenção de talentos. Em 2008, a empresa criou uma gerência de Recursos Humanos, encarregada de implantar programas de capacitação e valorização dos funcionários. O vice-presidente, Borenstein, afirma que algumas medidas em andamento são: a criação de um novo plano de cargos e salários e de um novo programa de participação nos resultados.

Na Tecnisa, a estratégia de retenção se reverteu em qualificação. No início do ano, a empresa criou a escola corporativa Tecnisa, oferecendo cursos de quatro meses em gestão e incorporação. "Acreditamos que as turbulências financeiras seriam passageiras e decidimos investir na capacitação para gerar maior eficiência na fase de recuperação", atesta. Ela relembra que a companhia havia dobrado seu quadro de funcionários em 2007 e não demitiu ninguém durante a crise.

Rouba-rouba

A chegada do período de novas contratações aponta, também, para uma nova onda de assédios aos especialistas empregados, com consequente pressão sobre os salários e aumento da rotatividade nas equipes das construtoras. Movimento semelhante foi observado durante o biênio 2007-2008, com o boom de obras, quando o desbalanceamento entre demanda e oferta de profissionais qualificados levou ao que ficou conhecido como "rouba-rouba" de engenheiros por empresas concorrentes. "Naquele período, a oferta de bonificação agressiva chegou a render aos executivos até nove salários a mais por ano", comenta Marucci. "Muitos executivos surfaram na euforia do mercado de 2007, permanecendo às vezes dois ou três meses em cada emprego", diz Moraes.

O consultor acredita, entretanto, que dessa vez vai demorar um pouco mais para os engenheiros virem seus "passes" se valorizarem tanto. "Hoje o poder sobre os salários ainda está nas mãos das empresas e elas não vão deixar que as forças sejam alteradas rapidamente", analisa Moraes.

Ainda assim, a consultora da Michael Page, Léa Fedelman, informa que o aquecimento da demanda por profissionais já está resultando em ofertas salariais mais vantajosas e até superiores às experimentadas durante o boom de contratações de 2007. "Hoje, os engenheiros ganham cerca de 20% a 30% a mais do que ganhavam em 2007", calcula Léa (veja a tabela abaixo). Mas ela admite que o aquecimento não chegou ao nível observado há dois anos. "Hoje temos algo mais de 150 vagas em todo o Brasil; em 2007, tínhamos 100 vagas só em São Paulo", lembra.

A executiva acredita que a euforia de 2007 gerou contratações desnecessárias e uma transferência de talentos muito agressiva entre empresas. Segundo ela, o movimento dos dias atuais está mais comedido, principalmente porque os próprios profissionais estão analisando melhor as oportunidades.

Embora a estabilidade seja entendida como um valor empresarial, os consultores afirmam que a intensificação da "dança das cadeiras" entre construtoras e incorporadoras é apenas uma questão de tempo. Com base em sua experiência, Moraes acredita que "exceto por um grupo de empresas do setor de águas e saneamento, que têm um acordo de cavalheiros para evitar a transferência de profissionais entre elas, sempre que o mercado aquece esse movimento se intensifica. Marucci, da Asap, completa: "Nesse reaquecimento ainda não deu tempo do troca-troca acontecer, mas muito provavelmente vai começar em breve".

Contra o acirramento da disputa por especialistas, 14 empresas do setor (entre elas Schahin e Klabin Segall), formaram o GRHECI (Grupo de Recursos Humanos das Empresas de Construção e Incorporação). O coletivo tem se reunido para analisar as pesquisas de emprego e, entre outras tarefas, pactuar regras de contratação, evitando o leilão de profissionais e aumento exacerbado de salários. "Esse leilão acaba por não trazer benefícios para ninguém", destaca Denise, da Tecnisa, uma das empresas integrantes.

Vale a lição do boom: muitas trocas de emprego podem ser prejudiciais para os próprios profissionais porque, embora eles conquistem salários mais atrativos, assumem o risco de perderem a possibilidade de um crescimento profissional sólido, com uma curva de aprendizado compatível com a remuneração.

  • Fonte: Construção Mercado
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