terça-feira, 20 de outubro de 2009

Dnit propõe fim do BDI

Diretor geral do DNIT aponta avanços com a padronização dos editais de licitação de obras e propõe o envolvimento de entidades de classe na discussão de temas polêmicos, como o fim do BDI.

A padronização dos editais de licitação de obras do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) simplificou o processo das concorrências, acelerou o ritmo de contratações e reduziu os questionamentos jurídicos. Essa é a avaliação do diretor-executivo do órgão, Luiz Antonio Pagot, para quem "a ação conjunta do DNIT com o Tribunal de Contas da União foi decisiva para que se pudesse implementar com o êxito que o edital tem hoje". Até o fechamento desta edição, um total de R$ 6,5 bilhões já havia sido contratado via editais padrão de licitações de obras e serviços.

Nesta entrevista exclusiva, Pagot defende maior desburocratização na licitação de obras públicas e afirma que o prazo de contratação já foi reduzido em mais de 120 dias com a padronização dos editais, em vigor desde o primeiro trimestre de 2008. O DNIT produziu três modelos básicos de edital: Menor Preço para Construção e Reconstrução; Técnica e Preço para Projetos, e Técnica e Preço para Supervisão. Esses editais podem ser realizados tanto por concorrência quanto por tomada de preço, com ou sem a participação de consórcio. Ao todo, oferecem ao construtor 12 possibilidades de escolha.

Para acelerar ainda mais o ritmo das contratações e garantir maior transparência ao processo licitatório, Pagot defende a extinção do BDI (Benefícios e Despesas Indiretas), propondo que os valores sejam inclusos no preço direto para orçamentação. A intenção do diretor geral do DNIT é envolver o poder público e as entidades de classe em uma ampla discussão para tratar desse e outros temas polêmicos que rondam as obras públicas.

Em fevereiro, o senhor convocou a imprensa e ameaçou as empreiteiras responsáveis por obras em rodovias federais com uma rescisão unilateral dos contratos. Atribuiu a elas o atraso nas obras, afirmando que a maioria havia assumido compromissos acima da capacidade de execução. Funcionou?

Nem imaginava que teria essa repercussão. Houve um evento em Minas Gerais, em que convoquei todos os empreiteiros que estavam realizando obras lá e fiz essa advertência a eles, dando um prazo até maio. Foi impressionante. Na época, falei que era questão de manutenção rodoviária; não admitia que as empresas ficassem fazendo corpo mole com isso. Ficaram atemorizados de entrar nessa "lista negra". Também adotamos outra medida aqui no DNIT que é a avaliação das empreiteiras na execução das obras. Hoje se emite um relatório de avaliação.

Com qual regularidade?

A cada obra é preenchido um relatório de avaliação. Temos uma ficha de avaliação de desempenho da obra, preenchida pelo fiscal de campo. Se a empresa não atingir os índices mínimos exigidos, não poderá fazer parte de processos licitatórios futuros. Até que consiga corrigir seus defeitos.

Como a empreiteira poderia se reabilitar?

Pela demonstração de que ela se recuperou na qualificação profissional, na execução do serviço. Na própria ficha, há o instrumento para isso. Mas esse procedimento já era praticado pelo antigo DNER [Departamento Nacional de Estradas de Rodagem] e apenas reeditamos de uma maneira mais moderna.

Em contrapartida, muitas empreiteiras atribuem à deficiência de projetos básicos, o motivo de pouca celeridade das obras públicas. Recentemente, o DNIT publicou editais padrões para licitação de obras. Essa padronização combate os problemas comuns de elaboração de projetos básicos insuficientes?

De 2005 para cá, foi iniciado um número muito grande de obras, na grande maioria, com projetos básicos e antigos, alguns com origem até no DNER. E mesmo alguns que foram revisados trouxeram no seu bojo alguns problemas. Mas, no transcorrer das obras, fomos transformando projetos básicos em executivos, tentando minimizar problemas. Já os projetos novos não nascem com esses problemas.

Por quê?

Lançamos uma licitação para 26 mil km de projetos Crema [Contratos de Recuperação e Manutenção das Rodovias] primeira etapa, também chamado de PIR-4, com custo de aproximadamente R$ 200 mil/km, e só estamos licitando a obra depois de fazer a execução dos projetos. Então, esses projetos vão oferecer infinitamente menos problemas. Também licitamos os projetos Crema segunda etapa, que são projetos para cinco anos de execução de obra de manutenção rodoviária. São 32 mil km de projeto a um custo aproximado de R$ 500 mil/km. Com certeza, esses projetos não vão nos oferecer mais problemas. Problemas temos basicamente em projetos e contratos anteriores a 2003.

Então, o senhor acredita que, com a padronização dos editais, os questionamentos jurídicos tendem a ser amenizados?

Com certeza. Não só com a padronização dos editais, mas também com a nova metodologia que passamos a desenvolver de iniciarmos a obra a partir do projeto executivo. Desde outubro de 2003, exatamente quando entrei no DNIT, aqui não se começa mais obra com, apenas, o projeto básico.

Como foi implementada e desde quando está valendo a padronização dos editais?

A partir de outubro de 2007, após a edição da instrução normativa 004/2007 do Ministério dos Transportes, o DNIT começou uma série de estudos, junto com a CGU [Controladoria Geral da União] e o TCU [Tribunal de Contas da União], com o objetivo de fazer um edital padrão. Consultamos inclusive a sociedade civil organizada sobre isso. A partir do primeiro trimestre de 2008, passamos a adotar o modelo. Entre março e julho de 2008, tivemos alguns problemas, até que todo mundo entendesse a metodologia. Mas após o debate e uma série de cursos para as empresas que participavam do processo licitatório, conseguimos estabelecer um amplo funcionamento desse edital padrão.

E como tem sido o desempenho?

Nos últimos oito meses de licitações, foi muito bom. Num total de R$ 6,5 bilhões de licitações, tivemos apenas dois problemas pequenos: 1) BR 452/GO - a empresa vencedora entrou com, aproximadamente, 30% de desconto. Não aceitando firmar o contrato, nos obrigou a nova licitação; 2) Problema de discussão jurídica na contratação dos serviços do gerenciamento das obras do edital 175/2009 (Rodoanel de São Paulo). Considero um êxito não só o procedimento do edital padrão, mas, principalmente, a nova metodologia que adotamos na CGCL (Coordenadoria Geral de Cadastro e Licitações), que é menos burocrática e mais ágil nas análises e homologação de resultados. Posso dizer que o prazo de contratação encurtou em mais de 120 dias.

O que mudou nos editais em relação aos anteriores?

Todos os itens que têm de constar nos editais estão rigorosamente programados em uma sequência, que vai desde a parte da documentação até a de orçamento. Antigamente, existia muita controvérsia em relação ao ordenamento e alguns editais não abrangiam o todo. Agora isso acabou. Hoje há duas partes definidas, documentação e proposta orçamentária, e todas elas têm de ser preenchidas, de maneira que fique claro o que se quer licitar, prazos, valores orçamentários, solicitações de atestados, entre outras questões.

Quais as diferenças entre os editais nas diversas modalidades de contratação?

Temos editais para contratação de projeto, de serviço e de obra. Basicamente, essas são as três modalidades. O edital de obra - o mais completo e detalhado - exige que todos os insumos sejam contemplados: homem-máquina, hora-máquina etc., e todos os estágios de uma obra, passando pela execução das etapas de terraplanagem, pavimentação, drenagem. O edital de projeto, além de trazer os objetivos, é mais simples, com especificidades para o tipo de projeto - ferroviário, hidroviário e rodoviário. Já as características do edital de prestação de serviço são definidas em função do tipo de serviço e de aquisição que será feito. Em aquisição de insumos, normalmente, para o melhor funcionamento do órgão, temos utilizado pregão eletrônico. Na questão orçamentária, que é uma parte importante e tem de ser apresentada com os atestados técnicos, há editais que são de menor preço e editais de técnica e preço. Normalmente, utiliza-se técnica e preço para projetos, e menor preço para obras.

Os editais oferecem estreitos limites de tolerância para descontos, evitando práticas de mergulho de preço?

Não podemos estabelecer se o candidato pode mergulhar muito ou pouco e qual o desconto ele vai dar no processo licitatório. Tenho certeza de uma coisa: empresas que ultrapassam 10% de desconto dificilmente vão conseguir entregar sem ter prejuízo, porque os custos estão cada vez mais apurados, as tabelas Sicro (Sistema de Custos Rodoviários) cada vez mais evoluí das e os levantamentos de preço são extremamente próximos da realidade do mercado. Se as empresas se atreverem a fazer uma redução muito grande de preço, elas certamente não vão conseguir fazer a obra. Vão causar problemas constantes, solicitando aditivos, redefinições e assim por diante.

Mas há, nos editais padrões, mecanismos mais rigorosos para evitar a prática de subpreço do que prevê a Lei 8.666?

A lei é muito flexível. Ela não estabelece preço mínimo nem preço máximo. Fazemos um levantamento, colocamos o edital na praça em função dos custos estabelecidos na tabela Sicro e no orçamento do projeto. Agora, em alguns casos, se a empresa mergulha muito, dobramos a solicitação de caução. Nosso medo é que as empresas que dão desconto elevado acabem provocando uma distorção. E estamos tentando corrigir isso requisitando uma caução extra desde outubro de 2007.

Nos editais padrões, foram estabelecidos critérios de aceitabilidade de preços unitários?

Mediante o projeto, se faz um orçamento com base na tabela Sicro, que é constantemente atualizada. Não temos uma segunda avaliação. Projeto pronto, projeto aprovado, projeto orçamentado; sai da diretoria de projeto e vai para a diretoria de infraestrutura rodoviária; é emitido o parecer e vai ser licitado.

Houve padronização do índice de preço?

A tabela Sicro que está em uso hoje é a Sicro 2. Já evoluímos para a Sicro 3, que está em consulta no mercado. Em setembro iniciamos a consulta e agora, a partir de outubro, lançamos os próximos editais já dentro da Sicro 3, depois de as tabelas serem exibidas à CGU, ao TCU, ao mercado.

A padronização dos editais também evitará a criação de regras casuísticas, abrindo-se brechas para participação de algumas empresas, em preferência a outras?

Essa é uma questão de atestado. Regulamos essa matéria junto com o TCU. Reduzimos bastante a necessidade de apresentação de atestados, e isso democratizou o processo licitatório e permitiu que mais empresas participassem. O ideal seria que as empresas tivessem mais responsabilidade, mais disciplina e não se atrevessem a participar de obras para as quais não têm capacidade técnica nem qualificação profissional. Enfim, o ideal é que não precisássemos de atestado nenhum e tudo fosse licitado por menor preço, e não por técnica. Mas ainda estamos muito longe dessa perfeição, tanto por parte das empreiteiras de obras rodoviárias quanto das empresas de consultoria de projetos. Estamos muito aquém da autorregulação do setor. A requisição de atestados é diretamente proporcional à dificuldade da obra. Mais dificuldade, mais atestados. Ainda assim, temos reduzido muito as exigências.

Agentes do setor costumam dizer que os contratantes públicos não calculam adequadamente o BDI (Benefícios e Despesas Indiretas) porque acreditam que, em muitos casos, se trata apenas de lucro. Dizem ainda que tabelaram um BDI de 22% para todas as obras. Os editais padrões do DNIT trazem um BDI padrão por tipo de obra?

O primeiro grande questionamento é o que está no B e o que está no DI. Essa é a primeira pergunta a se fazer aos empreiteiros. Às vezes, tudo é transformado em planilha e não se tem o B, só o DI, ou o contrário. Eu, particularmente, defendo que se acabe com esse assunto chamado BDI.

Por quê?

Para que vá tudo para preço direto, tudo para orçamentação. Aí se deixa bem claro o que é índice de lucro, o quanto será tolerado de porcentagem de lucro, 10%, 11%, 15%... e acaba com essa discussão interminável. Às vezes, um BDI de 40% tem menos impacto na obra do que um de 19%. Depende do que está no B e do que está no DI. Acredito que acabar com o BDI traria uma transparência no processo. Com certeza aceleraria o ritmo de contratações. Outra coisa: diminuiria muito a discussão com o próprio TCU.

O senhor acredita que a extinção do BDI seria aprovada?

Isso tem de ser discutido. Fiz essa proposta em um fórum diretamente coordenado pela Secob [Secretaria de Fiscalização de Obras do Tribunal de Contas da União] e tivemos uma longa discussão sobre vários temas, inclusive sobre o BDI. A proposta foi apresentada no dia 1o de setembro, num fórum da Auditar [União dos Auditores Federais de Controle Externo].

A proposta foi bem aceita?

Não consegui ficar para o debate. Apresentei a proposta e houve uma ou duas manifestações positivas. Agora, como ordenar isso; não só o BDI, mas todas as outras questões que temos de revisar para o andamento das obras públicas? Tenho uma sugestão, que é organizar, com a sociedade civil, um grande mutirão em que CNT [Confederação Nacional dos Transportes], CNI [Confederação Nacional da Indústria], CBIC [Câmara Brasileira da Indústria da Construção], ABCE [Associação Brasileira de Consultoras de Engenharia], Crea [Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia] e outros sentassem em torno de uma mesa para discutir esses temas conflitantes das obras públicas. A sociedade civil organizada tem recursos e poderia contratar um trabalho a ser feito pelos maiores especialistas nacionais. Pessoas da mais alta qualificação que se debruçariam sobre todos esses temas conflitantes.

Entre os temas estaria o Índice de Conforto do Pavimento Rígido?

Sim. Algumas obras nossas apresentaram 280 mm/km [milímetros por quilômetro], outras 350, outras 410. E estamos tendo uma discussão com o TCU, que quer adotar uma regra internacional vinculada com uma regra nacional de 240 mm/km. Acreditamos que essa alternativa possa ser viável do médio para o longo prazo, mas não no curto prazo. Até porque não temos um disciplinamento sobre isso e não fizemos nenhuma exigência no edital de licitação. Para evitar esse tipo de polêmica, o ideal é que se consiga, por meio desse grupo de trabalho, ter um instrumento para balizar uma discussão com o TCU e verificar o que pode e o que não pode ser adotado.

O presidente Lula reclamou recentemente de supostos excessos do TCU, afirmando que "a máquina de fiscalização é muito mais eficiente que a máquina de execução". Citou como prova a diferença salarial entre um engenheiro do DNIT e um auditor do tribunal, que ganha quase três vezes mais. O senhor mesmo chegou a defender que o TCU deveria ter maior flexibilidade. Qual é o relacionamento entre DNIT e TCU?

O TCU tem que mudar sua metodologia; não é ser flexível não. O TCU tem que continuar com sua rigidez na fiscalização, mas tem que padronizar a fiscalização. E ele já está fazendo isso, tanto que, a partir do ano que vem tudo vai ser coordenado por Brasília. O que defendo são novas metodologias. E muitas vezes o ministro Ubiratan [Aguiar, presidente do TCU] está com a razão quando diz que é preciso mudar algumas leis; é verdade.

Mas qual o relacionamento entre DNIT e TCU?

Considero excelente. Só se consegue resolver os problemas nesse nosso Brasil enorme, com tantas coisas para construir, para evoluir, por meio do diálogo. Não vejo de outra forma.

Fonte: Pini.com

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