quarta-feira, 26 de maio de 2010

No setor elétrico, terceirizados sofrem mais acidentes


Milton trabalhava na substituição de um poste naquele fatídico dia de novembro de 1990. Era mais um dia de trabalho co­mo terceirizado para uma grande concessionária de energia elétrica mineira. A função a ser executada era a substituição de um pos­te. Naquela época, tinha apenas 23 anos e nunca havia recebido treinamento em Segurança do Trabalho. O encarregado liberou a subida ao poste. No en­tanto, a alta tensão estava ligada e o jo­­gou ao chão antes mesmo de terminar de subir. O choque que levou foi de 7.900 volts, o su­ficiente para que perdesse o bra­ço esquerdo na hora e depois de 20 dias, as duas pernas."Quando tomei a descarga de alta tensão, caí no chão e pedi para que não me dei­­xassem morrer. Com o acidente, a­pren­di tudo de novo", conta Milton Ribeiro Marcelino, hoje aos 43 anos. Assim, Mil­ton continuou sua vida: constituiu família e lutou por 18 anos para obter na justiça o direito à indenização e à pensão vitalícia. "Tenho meu filho e minha esposa. Não queria morrer e deixá-los sem nada", diz.

Quase 20 anos depois do acidente de Milton, os terceirizados continuam sendo os que mais morrem no setor elétrico. Isso é o que mostra o estudo do Sindieletro/MG (Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais) e do Dieese (Departamento In­tersindical de Estatística e Estudos So­cioeconômicos) - "Terceirização e morte no trabalho: um olhar sobre o setor elétri­co brasileiro". O relatório foi baseado nos dados da Fundação COGE (Fundação Comitê de Gestão Empresarial), que reúne 64 empresas responsáveis por 90% da energia produzida no País.

A análise mostrou que em 2008, a taxa de mortalidade da força de trabalho do se­tor elétrico foi de 32,9 mortes por ­grupo de 100 mil trabalhadores. Essa taxa entre os trabalhadores terceirizados foi 3,21 vezes maior do que a do quadro próprio, sendo de 47,5 para os terceirizados contra 14,8 para os trabalhadores próprios.

"No nosso entendimento os trabalhadores terceirizados possuem condições de tra­­balho piores em relação aos trabalhado­res próprios, que vão desde o treinamento dado para exercer a função, passa pela fal­ta ou não da utilização de ­equipamentos de proteção, e culmina com questões rela­cio­nadas a salários e benefícios menores e mesmo a falta de representação sindical", analisa o técnico do Dieese na Sub­seção do Sindieletro/MG, Fernando Du­arte.

Fernando acredita ser essencial que o tra­­balhador do setor elétrico tenha boa for­­mação técnica. No entanto, os ­menores salários do terceirizado vão contra es­se ideal. Jornadas de trabalho extensas pa­ra melhorar o ganho e a cobrança por pro­­dutividade também interferem na ques­­tão. "São fatores importantes para se com­preender a maior taxa de mortali­da­de dos trabalhadores terceirizados em re­­lação aos trabalhadores próprios", diz o téc­­nico.

"No que se refere às ações junto às contratadas, o cenário realmente não é tão oti­mista. Não acho que o problema seja o fa­to de terceirizar. Se isso for bem feito, é vá­lido. Conheço indústrias que contratam grandes e renomadas empresas para fica­rem responsáveis pela operação e manutenção elétrica do empreendimento com re­sultados altamente satisfatórios. Todavia, é preciso que se remunere razoavelmente a empresa terceirizada, para que ela possa oferecer aos seus empregados as mesmas condições de Segurança do Tra­balho que são oferecidas aos emprega­dos das empresas do setor elétrico", avalia o gerente de SST da Fundação COGE, Cesar Vianna Moreira.

O gerente da Fundação acredita que o Relatório de Estatísticas de Acidentes no Setor Elétrico Brasileiro - 2008 da institui­ção, utilizado pelo Dieese, mostra a transparência da área. "Seria muito bom pa­ra o nosso País que outros setores produtivos assim apresentassem os seus dados, a fim de que as ações preventivas ou cor­retivas seguissem as prioridades e necessidades específicas de cada segmento", afirma Moreira.

Na análise da Fundação COGE, as atividades ligadas à construção e manutenção de redes elétricas, consideradas de ­maior risco de acidentes, vêm apresentando resultados ainda insatisfatórios. No ­entanto, percebem uma queda de 30% na taxa de mortalidade entre as contratadas no ­geral, de 2004 para 2008, que foi de 67,56 para 47,49 em cada grupo de 100 mil trabalhadores. A instituição aponta ainda uma queda na taxa de gravidade.

Fonte: Revista Proteção / Foto: Benedito Maia

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