quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

TCU enquadra preços de obras e obriga revisão

Decisão do Tribunal de Contas da União estipula limites para o BDI e cobra gestores a cumprirem determinação, mesmo sob reclamações do mercado.

O Tribunal de Contas da União (TCU) publicou um acórdão que tem implicações diretas nos editais de obras e serviços de engenharia. Pelo acórdão no 2.369, de 20 de setembro, foram definidos os porcentuais mínimos e máximos para os Benefícios e Despesas Indiretas (BDI) em obras com participação de dinheiro do Governo Federal. O BDI é a soma do lucro, dos tributos e das despesas indiretas em uma obra. Ao lado dos custos diretos, ele totaliza o preço final do empreendimento (veja mais no quadro Do que é feito o BDI).Segundo o tribunal, a definição de margens para o BDI não é obrigatória e serve apenas como referência para os auditores no trabalho de fiscalização e combate ao superfaturamento. Na prática, porém, ele cobra dos licitantes a adoção dos porcentuais estipulados, o que é abominado por empresas e institutos de engenharia.

"Os auditores vão usar como parâmetro os referenciais descritos no acórdão e, com certeza, vão questionar se o BDI estiver fora das margens", afirmou à revista Infraestru­­­­­­­­tu­ra Urbana o ministro do TCU Marcos Bem­querer Costa, relator do acórdão. "Está claro que o tribunal quer que isso seja seguido", acrescentou.

Tão claro que, apenas seis dias após a publicação do acórdão, em 26 de setembro, o órgão fiscalizador determinou a suspensão da licitação das obras de construção do píer de atracação para navios de passageiros no Porto do Rio de Janeiro, apontando, entre outros motivos, a previsão de BDI acima do que estipulara o acórdão. Por conta disso, a Secretaria de Portos do Rio agora está revisando outros seis editais de licitação que haviam sido publicados, para ajustá-los às novas referências.

Em Santos, a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) também alterou o edital para execução das obras de construção e adequação do cais de Outeirinhos para atender à demanda do TCU. A diminuição do BDI fez o valor previsto para o empreendimento cair de R$ 325 milhões para R$ 319 milhões. "Editais com BDI fora do referenciado estão sujeitos ao embargo por não cumprirem a determinação (do TCU)", admitiu a assessoria da estatal.

O Ministério do Planejamento, questionado pela reportagem, informou que os órgãos envolvidos com a execução de obras examinarão em cada caso as referências indicadas pelo TCU na nova decisão, considerando que pode haver ajuste de acordo com as peculiaridades de cada empreendimento. Em relação às obras em execução, a decisão não retroage aos contratos em andamento cujos BDIs estejam de acordo com os parâmetros anteriormente aceitos pelo TCU, avalia a pasta.

Tipo de obra e valor

O acórdão 2.369/2011 estabeleceu porcentuais para os Benefícios e Des­­pesas Indiretas de acordo com a cate­­­­go­­ria da obra e seu valor orçamentário. Há cinco categorias (sem contar suas subdivisões): obras de edificações, hídricas, portuárias, aeroportuá­rias e as rodoviárias e ferroviárias. As faixas orçamentárias também somam cinco: obras no valor de até R$ 150 mil; de R$ 150 mil a R$ 1,5 milhão; de R$ 1,5 milhão a R$ 75 mi­lhões; de R$ 75 milhões a R$ 150 mi­­­­­­­­­­l­hõ­­­es; e acima de R$ 150 milhões.

Por exemplo: as margens para o BDI de uma obra de reforma em edificação estimada em até R$ 150 mil podem variar de 22,40% a 31,90%. Já as margens para a mesma categoria de obra na faixa superior a R$ 150 milhões caem para o limite de 17,90% a 27,20%. Entre todas as categorias e faixas, o porcentual máximo permitido não ultrapassa 32%. Veja tabelas à parte.

Para chegar a esses valores, técnicos do tribunal elaboraram uma espécie de média estatística a partir de uma grande quantidade de BDIs observados em contratos de órgãos públicos. A consulta abrangeu entidades ligadas aos setores sob avaliação, co­­­mo o Departamento Nacional de Infra­­es­­tru­­tura de Transportes (Dnit) e a Em­­­presa Brasileira de Infraestrutura Aero­­por­­tuária (Infraero). "Antes, o auditor não tinha referências para afirmar se um BDI de 20% ou de 40% era muito alto ou baixo", conta o ministro Bem­­querer Costa. "A nossa intenção é que ele reflita o mais próximo possível os custos das empresas, sem permitir sobrepreços", disse.

Críticas

No mercado de construção, porém, a resolução foi duramente criticada. Setores ouvidos pela reportagem afirmam que o acórdão apresenta margens que não condizem com a realidade e ainda implicam uma ingerência sobre o lucro das corporações. "Somos contra um órgão fiscalizador fixar quanto uma empresa vai ter de lucro. Isso é contra a economia de mercado e as estratégias das empresas", afirma Luciano Amadio, presidente da Associação Paulista de Empresários de Obras Públicas (Apeop).

Segundo Amadio, também não é possível tabelar margens para o BDI, pois o cálculo dessas variáveis depende das condições das obras de engenharia, cujas características são extremamente peculiares e variáveis. "O BDI de um prédio no Centro de São Paulo é diferente do valor para um prédio igual na periferia. Uma estrada projetada para a Amazônia tem BDI diferente de uma em Minas Gerais", argumenta, citando aspectos logísticos que tornam o em­­pre­­­­endimento mais barato ou mais caro.

"Estou indignado. Os valores estão muito abai­­­­­xo. Faço cálculo de BDI há mais de 30 anos e nunca achei um abaixo de 30%. Isso não existe", desabafa Paulo Roberto Vilela Dias, presidente do Instituto Brasileiro de Engenharia de Custos (Ibec). "Gostaria que o TCU fizesse pesquisa de valores reais junto às empresas", critica.

Na opinião de Paulo Dias, é admissível que os auditores adotem um referencial como auxílio para a fiscalização. No entanto, ele defende que as empresas possam praticar BDIs fora das margens, desde que esclarecidos. "Se for justificado pelo estudo técnico, tem que ser aceito, não há o que discutir". Caso contrário, diz ele, existe o risco de os licitantes adotarem automaticamente os porcentuais apresentados pelo tribunal, sem verificar os valores exatos por meio de cálculos realizados dentro da Engenharia de Custos.

Justificativas

"O fato de uma empresa ter BDI diferente não quer dizer que a obra vai ser automaticamente impugnada, mas sim questionada", pondera o ministro Marcos Bemquerer Costa. Ele afirma que a definição de valores mínimos e máximos para a taxa ajuda os dois lados - fiscais e empresas - uma vez que as margens também servem para as companhias formularem propostas mais competitivas durante as licitações.

Em relação à compatibilidade dos porcentuais com a prática do mercado, Bemquerer Costa admite que a harmonia "é difícil", mas que o estudo técnico é complexo e "tenta chegar o mais próximo possível da realidade". Um avanço nesse quesito, avalia, foi a separação das obras em categorias e faixas de orçamento, medida que aumentou a precisão dos tetos.

O ministro ainda explica que, mesmo que uma empresa tenha uma proposta com o menor preço, o BDI pode ser questionado se estiver fora das margens, porque o regime de contratação de obras no Brasil considera o preço unitário. Isso significa que cada um dos itens do projeto é analisado, independentemente do valor global do orçamento. "O chamado 'perde aqui, ganha ali' não funciona para a legislação brasileira", diz.

Do que é feito o BDI?

Composição

-> Rateio da administração central
-> Despesas financeiras
-> Risco, seguro e garantia do empreendimento
-> Tributos
-> Lucro

Cálculo

O cálculo da taxa de BDI se baseia na incidência de cada um de seus componentes sobre os custos diretos da obra.

Itens excluídos

Esses itens não entram na taxa de BDI e devem constar na planilha orçamentária:

-> Ferramentas e máquinas para a execução das obras
-> Licenças ligadas à aprovação de projetos, como o Alvará de Construção e o Habite-se
-> Despesas com saúde, medicina e segurança dos trabalhadores
-> Gastos com medidas para evitar danos ambientais
-> Administração local e instalação de canteiro

Riscos de embargo

O acórdão 2.369/2011 do Tribunal de Contas da União (TCU) não tem força de lei, mas é taxativo ao definir o teto para os Benefícios e Despesas Indiretas (BDI) em obras públicas. Dessa forma, licitações com porcentuais acima do limite serão questionadas pelo órgão fiscalizador e estarão sujeitas a embargo, segundo o ministro Marcos Bemquerer Costa, relator do caso.

No entanto, os referenciais estabelecidos pelo documento (que não ultrapassam 32%) ainda podem mudar. Isso porque o acórdão é provisório e está sob revisão de uma equipe técnica no próprio TCU, que tem até março de 2012 para reavaliar as amostras, cálculos e números finais. O ministro acredita que esse prazo será estendido, em função da complexidade do estudo, e não tem previsão de prazo para a conclusão. Até lá, este acórdão continua valendo.

A decisão não impacta os contratos em andamento cujos BDIs estejam de acordo com os parâmetros anteriormente aceitos pelo TCU. Desta forma, não se espera uma ampliação de embargos a obras em andamento, de acordo com avaliação do Ministério do Planejamento.

Por fim, vale lembrar que o acórdão diz respeito apenas a obras com participação de dinheiro do Governo Federal. Gestores de empreendimentos ligados ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por exemplo, devem ficar atentos.

Fonte: http://www.infraestruturaurbana.com.br/solucoes-tecnicas/9/artigo241023-2.asp


Um comentário:

  1. É incrível como nos grandes empeendimentos do governo sempre tem um esperto para intermediar as coisas. o que não falta nesse país são valerios pra levar uma fatia do dinheiro público.

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